domingo, 17 de junho de 2007

O esplendor da democracia...



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CORRUPÇÃO !
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"… por que motivo são os promotores imobiliários e os construtores os grandes financiadores da vida partidária?
As contrapartidas deveriam ser seriamente analizadas."
Palavras de Paulo Morais, antigo vice-presidente da Câmara do Porto e ex-vereador do Urbanismo.

Jornal de Notícias
Tem vindo a denunciar as "trapalhadas" nos pelouros do urbanismo, e o conúbio entre o poder autárquico e os interesses dos directórios partidários. Como se desenvolve, afinal, esta relação?
Paulo Morais
O planeamento e a gestão urbanísticos constituem, hoje, um dos maiores problemas nacionais e um dos maiores cancros da democracia, senão mesmo o maior.
É através do urbanismo que se valorizam, à custa de recursos públicos, bens privados de forma quase sempre ilícita. Mais de 90% dos problemas nas autarquias têm a ver com este sector as suspeitas de corrupção, o tráfico de influências e as pressões.
A recente queda da Câmara de Lisboa aconteceu porquê? Porque houve trapalhadas no urbanismo.
E isto não acontece por acaso. Tem causas que são conhecidas, mas por quem não quer alterar este estado de coisas. Um pelouro do urbanismo deveria fazer o seguinte: planear o território em função do interesse colectivo, licenciar em função desse planeamento e fiscalizar em função do planeamento e do licenciamento.

JN
Não é isso que acontece?
PM
Acontece exactamente o contrário planeia-se num esquema de bolsa de terrenos que valem mais ou menos em função de quem é o seu proprietário. Depois, licencia-se em função de quem é o promotor envolvido. Por último, a fiscalização é uma fraude. Isto faz, por exemplo, com que, de Norte a Sul, as revisões dos planos directores municipais (PDM) não sejam mais do que a alteração da condição de utilização de solo de terreno agrícola para terreno urbanizável.
A Autarquia valoriza os terrenos em 40 ou 50 vezes, o que faz com este tipo de negócio só seja comparável, em termos de rentabilidade, ao tráfico de droga em Portugal. E, no urbanismo, o negócio ainda é menos sério.
(…)

JN
É um mercado paralelo?
PM
É quase uma área de actividade económica. Um Estado que tem a capacidade, através de medidas administrativas, de valorizar, de forma exponencial, património privado, é muito vulnerável e permeável a interesses. E é natural que se crie, à volta da política partidária, um conjunto de pessoas que vive da intermediação entre interesses privados e administração pública.
Através de processos eleitorais, de nomeações, das máquinas partidárias, colocam-se na administração pessoas que só estão lá para favorecer os interesses privados, porque são estes que lhes financiam as carreiras e a actividade política. É quase uma questão de gratidão.

JN
Quem são o traficante, o intermediário e o consumidor?
PM
O bem traficado é o território, o património e tudo o que é infra-estrutura e ambiente.
Os traficantes são quem, na administração, nos partidos ou nessa esfera de influência, desenvolve a sua actividade no sentido de transferir bens públicos para a mão de privados, os tais interesses instalados que dominam o nosso regime.

JN
São dirigentes partidários?
PM
Em Portugal, estamos a falar de todo o sistema. É um cancro. E podemos dividir isto em duas matérias administração local e administração central. O urbanismo tem mais a ver com a primeira. Um terreno pode ser transformado, numa manobra de planeamento, num local onde se pode edificar. Depois, com a assessoria de certos gabinetes de advogados, pode, eventualmente, licenciar-se para além do planeamento.
Um promotor com grande capacidade de influência sobre o poder pode licenciar o que o planeamento não permite, como tem acontecido ao longo deste país e também no Porto. E pode diminuir a capacidade de intervenção da fiscalização.

JN
Como inverter a situação?
PM
Bastaria um planeamento simples, que não deixasse dúvidas; um licenciamento que fosse meramente administrativo e uma fiscalização que fosse aleatória. Ou seja, todos nós poderíamos ser fiscalizados e isso permitiria que o processo fosse mais sério.

JN
Quem são, exactamente, os beneficiários?
PM
São, claramente, os promotores imobiliários que têm capacidade de influência sobre as autarquias. Por que motivo são os promotores imobiliários e os construtores os grandes financiadores da vida partidária? Naturalmente que querem alguma coisa em troca. Por que ninguém analisa quais são as contrapartidas destes financiamentos? E não falo apenas de financiamento dos partidos, mas também da vida de todos que giram na órbita dos partidos.
No financiamento partidário, quem arranja dinheiro para os partidos fica com 40%. Por isso, há muitas pessoas que nunca tiveram actividade conhecida mas acumulam fortunas.
(…)

JN
O que é possível fazer ao nível do urbanismo?
PM
O mais importante é intervir nas causas. O regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial tem já oito anos. Preconizava-se que as condições segundo as quais os solos podiam ser reclassificados de rurais para urbanizáveis seriam excepcionais. Teriam de ser regulamentadas de forma uniforme no país e em 120 dias. Passaram oito anos e nada.
Quatro chefes de Governo ficaram reféns das negociatas. A legislação do urbanismo em geral tem que ser simplificada. Por que o Parlamento não faz isso? Porque os deputados são mais do que funcionários de partidos ao serviço do líder do momento. E os líderes dos partidos, por sua vez, também não podem alterar o estado de coisas porque iriam prejudicar quem os financia.

* com a devida vénia à Carla Soares, ao Fernando Timoteo e ao "JN"
excerto de um artigo publicado a 17/06/2007

9 comentários:

Anónimo disse...

Amigo Lugano: en España esa "pelicula" ya la hemos visto......Marbella, Ciempozuelos (O Cuarenta Pozuelos, Pozuelo de seseña, pozuelo de entrevías).......

Anónimo disse...

Não li toda a entrevista porque deixei de comprar jornais há muito, só este excerto agora, mas tenho pena.
Cá está uma personagem política que fala CLARO (como os nossos vizinhos espanhóis costumam designar e bem o discurso das pessoas que se exprimem dum modo franco e aberto, isto é sem subterfúgios), a excepção à regra que existe em todo o lado e em todo o mundo. Mas quantos destes (aparente e estranhamente poucos) Bravos à maneira antiga, haverá em Portugal, um País de Heróis? E quantos deles não seriam necessários para acabar com a escandalosa macrocorrupção que nos inunda e sufoca, denunciando-a aos quatro ventos e sem temor? Aquela que se entranhou e petrificou em todos os sectores da sociedade, atingindo patamares de uma tal ordem de grandeza que seria impensável, nem sequer em sonhos, ser concebida outrora e que nos tem vindo a destruír (cujos autores primeiros a vêem diabòlicamente praticando com perícia de mestres desde há trinta e muitos anos, mas hipòcritamente fingindo o contrário) lenta mas eficazmente como Nação, que nos está a retirar como Povo o orgulho de o ser, que nos envergonha tão intensamente perante nós próprios e os outros que nos despedaça o coração e já com a pouca esperança que nos resta deste inferno terminar de vez e dias melhores se aproximarem, nos está a corroer irremediàvelmente a alma?
O que é que este Povo cuja matriz moldou os Maiores deste País, pode fazer para acabar com esta infindável tragédia?

Maria

Anónimo disse...

António, enviei-lhe agora mesmo um mail com algumas respostas e outras perguntas. Desculpe o atraso mas só agora tive algum tempo livre e os temas que levantou eram de tal forma importantes que mereciam comentários desenvolvidos. Anda são umas 4 páginas de divagações para o chatear :)

A propósito do título do artigo e já que encontro o Gelmirez por aqui talvez ele tenha lido a interessantíssima entrevistra do Phillip Allot ao El Mundo e nos possa dizer algo mais sobre ela. O título era sugestivo mas para a ler na íntegra é necessária subscrição:

“La democracia y el capitalismo son sistemas más totalitarios que el nazismo o el estalinismo”.

Em relação ao post propriamente dito, é uma entrevista importante e ainda bem que aqui publicou esses excertos já que eu, tal como a Maria, há muito que deixei de dar dinheiro aos jornais, mas ainda mais estranho é termos de reconhecer a invulgaridade do que é dito quando todos sabemos as relações de corrupção entre autarquias e lóbis de construção, por todo o país. Mostra o estado de bovinidade e compadrio do próprio sistema, alguém que diz o óbvio já nos merece alta consideração.

António Lugano disse...

Maria
A sua revolta é digna... e cada vez somos mais a reagir de igual forma.

António Lugano disse...

Gelmirez
A democracia é um regime de demagogia e corrupção, em Portugal como em qualquer outro país ou nação.
São caracteristicas fundacionais da "coisa" !

António Lugano disse...

Rodrigo
Vou ler o seu estimado "e:mail" e desde já prometo-lhe uma resposta pela mesma via.
Quanto à entrevista do Phillip Allot pode ler um pequeno extracto em : http://urioste.wordpress.com/2007/06/09/el-totalitarismo-de-la-democracia-y-el-capitalismo-con-philip-allott/
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Abraço

Anónimo disse...

Acertado Decreto del General Franco de 1937 ilegalizando los Partidos Políticos........

c disse...

"em Portugal como em qualquer outro país ou nação."

Não me parece, especialmente no Setentrião.
De qualquer forma não me parece ver grande incómodo com a Democracia onde quer que seja.

E, já agora, será que nos «outros» regimes não existem essas, digamos, «características».
(«corrupção» e «demagogia» não faltam (e não faltaram) em regimes não democráticos.)
Essas são «características» humanas que sempre existiram e, para subsistirem, não precisam (e nunca precisaram) da Democracia para nada.

«“La democracia y el capitalismo son sistemas más totalitarios que el nazismo o el estalinismo”.»

Se isto não é uma afirmação demagógica já não sei o que o seja.
Disse esse Sr. isso a um periódico da «democrática e não menos capitalista» Espanha porque, muito provavelmente, nunca viveu na Alemanha nazi nem na URSS estalinista pois, se em qualquer um desses dois «Sonnen der Menschlichkeit» (ou «Солнца гуманитарныа науки», como preferirem) ele tivesse a ousadia de dirigir observações desse tipo a qualquer um desses regimes então vigentes (partindo do princípio que teria sequer oportunidade de botar faladura) o mais certo era......

António Lugano disse...

ao "gauleiter de chelas"
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1.
Considera que o facto de existir corrupção em regimes "não-democráticos" justifica a corrupção em regimes "democráticos" ?
Parece-me um conceito de Justiça, pelo menos, equívoco !
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2.
«“La democracia y el capitalismo son sistemas más totalitarios que el nazismo o el estalinismo”.»
Essa reflexão é de Phillip Allot, não minha.
Imputar-me algo que nunca afirmei, isso sim, é demagógico além de falacioso.