terça-feira, 10 de julho de 2007

Os Gouvarinhos da modernidade (1/2)



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conversas
"interessantíssimas"
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Sobre a ironia, esperamos que todos a entendam como uma figura de retórica, uma expressão contrária ao que se pensa, uma forma de provocar a reacção do leitor fazendo-o reflectir e enfrentando-o à antífrase.
O próprio Aristócles (aliás Platão) considerado "divino" por gerações de seguidores da lógica, da sofística e da maiêutica dos seus diálogos, foi insistentemente irónico, principalmente através do seu personagem Sócrates, ele mesmo uma invenção irónica do fundador da Academia.
Ao citar a ironia de Platão não estamos, obviamente, a pretender justificar o nosso texto, a tanto não chega o atrevimento, mas tão somente a solicitar condescendência para o mesmo… e para o seu autor.
Baruch Spinoza, ou Bento de Espinoza, (1632-1677) no "Tratado teológico-politico", publicado anonimamente em 1670, pedia aos seus leitores para "não rir, não chorar, não troçar, mas compreender".
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Gouvarinhos, o eurodeputado e o nacionalismo

Na agitação cosmopolita das grandes urbes, prosseguem os jantares-convivio em casa dos émulos do Conde de Gouvarinhos, esse intemporal personagem de Eça, como marcadores de pauta do "correcto pensar" da burguesia intelectualizada.
Temporalmente distante dos cenários do décimonono século, brilhantemente reproduzidos pelo co-autor das "Farpas", os saraus realizam-se agora nos jardins da mansão do eurodeputado Felizberto d'Almeida e Torres, integro democrata-mação, e desde 1975 de um só partido (embora existam ameaças de lhe partir o outro).
No "european portuguese new deal" já não se utilizam titulos de nobreza, mas sim de oportunismo, de comendadorismo e de trapaça.

Nos jantares-sarau, entre uma seleccionada assistência (que os reaccionários denominam "cáfila de malandros") fala-se muito, mesmo com a boca cheia, e discutem-se temas de rara visão estratégica.
Quanto à capital, roça-se a inaudita coragem de referir um novo super-aeroporto, com chegadas na Ota e saidas desde Alcochete, sendo a venda de bilhetes (e rifas) efectuada no Centro Cultural de Belém que, finalmente, servirá para alguma coisa útil.
Para o Porto, o "cubo da música", que alguns humoristas apelidam de "Casa da Música", é proposto pelos comensais o Guiness do "imensamente moderno", conjuntamente com o "pátio das mesquitas", novo "look" pós-pós-moderno que uns "eleitos" deram à alameda que jaz em frente à Câmara da mesma cidade.

Quando enfrentados a um salmão "farcie" condimentado com "sirop de gengibre", os convivas lançam-se em diálogos cuja retórica faria empalidecer o próprio Platão ; verborreia exponencial e logarítmica de sistemas quadráticos, demonstrativa de vacuidade e despropósito. Enfim, o discurso democrático na sua plenitude !

Em política corrente, alguns protestam veementemente pela forma demasiado agressiva com que o agrupamento PPD (Pipidi, em anglófano) conduz, no convento de S. Bento, os actos de oposição ao governo do PS (Piesse), o que, segundo afirmam, atinge a desvergonha de interromper o sono repousante de alguma "senhoria" distraidamente presente… Sugere-se a esse grupo que se comporte como já o faz fora desse local : quedo e mudo !

Timidamente, alguém refere que talvez não seja de boa educação (entre democratas) insinuar que o sr. Pinto de Sousa não é engenheiro…
Então, pigarreando, fungando e fazendo "tssst, tssst" com a lingua nos dentes, Aloisio Pingado, doutor-engenheiro-arquitecto, sócio do PS desde a "exemplar descolonização", diplomado pela escola primária da junta de Alcabideche, e com dois "honoris causa" pelas universidades de Macapá e Tabatinga, diz :
- O valor esta aí… na prática. Alguém alguma vez perguntou ao Sócrates se era licenciado em filosofia ?
- Como em filosofia, "atão nun é engenhêro" ?,
surpreende-se alguém.
- Refiro-me ao amigo do Platão…
- Amigo de quem ? "Óvi dezer qu'era amigo de um tal Diogo" !, afirma uma feminista.
Oh ! Afirmação demoniaca, negacionista e (talvez) homófoba. Vai daí, o ambiente arrefece. Torna-se mórbido !
Sopra o vento da meia-noite… anuncia-se o "coffee-break" das "zero e seis"… e termina o "sarau" !

Ocasiões há, em que situações socialmente dificeis como a descrita, são salvas pela rápida e decidida intervenção de Madame D'Almeida Torres, licenciada (dótôra) por afinidade electiva ("Wahlverwandtschaft" em teutão) e eurodeputada por matrimónio, conselheira de várias "ministras" da cultura pelos seus ímpares conhecimentos das praias nudistas entre Tróia e Sagres e pela sua pró-activa atitude "não-fumadora" e defensora da saúde (só "snifa" coca, o que é "imensamente democrático").

Para que se avalie a qualidade intelectual de Madame D'Almeida, mais conhecida por "se dótôra", relembro aquela questão por ela públicamente colocada ao eurodeputado seu marido, em determinado sarau na presença de várias outras europeias excelências :
- Ó Felizbertinho, você "na" podia influenciar para que a capital "Êropêa" fosse lá mais para as Caraibas onde a temperatura é "imensamente óptima" ?
Perante semelhante repto, o eurodeputado Macheco Macieira, que não perde uma de "comes e bebes", e que não é daqueles a baquear perante tão minima dificuldade, garantiu de imediato uma reunião, para marcar um "meeting" preparatório de uma assambleia que designe uma comissão encarregue de promover uma conferência em Burkina Fasso (questão de alternativa multiculturalista) onde a questão seria analisada.
Madame "se dótôra" entrou em extâse perante semelhante prova de funcionalidade operativa das "instituições".
Ah !, pensava ela olhando de soslaio o espelho que reflectia (com dificuldade) os seus 98 quilogramas de silhueta, se ao menos na tal Burkina houvesse alguém importante para estender o tapete "encarnado""Siga o cherne, minha amiga!", dizia-lhe uma voz…

Após "snifar" o seu democrático "gramita de coca", Felizberto D'Almeida Torres pucha pelo braço do seu rotundo amigalhaço Moares (confuso como sempre) e segreda-lhe, enquanto mastiga um pastel de baba de caracol (que dizem fortalecer a testa) :
- Pouca gente sabe da existência de um "protocolo", que eu apoio sem reservas, anunciando para o século XXII uma Europa versão Imperial (não confundir com "fino" ou "canha") de Jericó a Rabat e das Berlengas ao Kurdistão.
- Desde que não me toquem na Fundação… que se lichem todos
- profere Moares (solidário como sempre).

O que não sabia o Torres, é que a SIA tinha instalado microfones nas bochechas do Moares pelo que o clube "caveiras e tibias" foi imediatamente informado.
Ainda o Torres não tinha engolido o pastel que tinha entre dentes, e já as TVs da mansão (mais as de todo o mundo) transmitiam a estratégica resposta do "fellow" George B. "the second", que advertia, perante 666 correspondentes de Tvs, Rádios e Revistas de "comics" :
"Se a velha Iuropa, perdão, quero dizer Europa, quizer mudar de fronteiras, nos aceitamos "sempre e quando" seja na defesa dos valores ecuménicos do Banco Mundial, na declaração de principios de Guantánamo e… por outras coisas de que não me lembro agora…"
Perante tão sublime demonstração de saber, de conhecimento e de arte, Torres sentiu-se verdadeiramente euro-yankee.
continua

3 comentários:

Anónimo disse...

Ironía galaica del texto, la que le falta al Presidente del Getafe Club de Fútbol, Sr. Torres......

Anónimo disse...

Uma delícia! Ri que me fartei com estes seus dois textos que só hoje li, embora pela data veja que são anteriores à sua ida para ferias. Uma maravilha. Servem para desanuviar do peso horrível desta incrível política que nos atabafa e nos consome mais e mais a cada dia que passa, sem que se vislumbre uma solução rápida e eficaz para lhe pôr definitivamente fim.
Maria

Anónimo disse...

saavedra cita siempre la planta 72 del rascacielos 666 de nueva york, de donde salen las órdenes......